Crítica: Liniker e Johnny Hooker, vozes a serviço do empoderamento e da MPB

Por Jean  Pierry Oliveira


“A gente fica mordido não fica?/ Dente, lábio, teu jeito de olhar/ Me lembro do beijo em teu pescoço/ Do meu toque grosso, com medo de te transpassar” ou “ Respirando mágoas de uma outra dor/ Do nosso caso imoral/ Desse amor, desse amor marginal/ Eu vou”. Talvez você já tenha escutado os versos de “Zero” e “Amor Marginal”, de Liniker e Johnny Hooker, respectivamente. Ou não. Entretanto, se esse for seu caso, essas duas joviais figuras merecem a sua atenção.

Liniker e Johnny Hooker: música e amizade à serviço da representatividade
Foto: Reprodução/Facebook


Donos de personalidades ímpares, o paulista de Araraquara (Liniker) e o pernambucano de Recife (Johnny) moldam a nova geração da Música Popular Brasileira (MPB) com ares de empoderamento, sensibilidade, ousadia e qualidade. Amigos fora dos palcos, eles simbolizam a juventude que quer ser vista, ouvida e se faz presente por aí. Dotados de uma rara capacidade de extrair os mais sinceros e profundos sentimentos, encravados em relacionamentos mal sucedidos, finalizados ou paixões platônicas por outros rapazes (sim, rapazes), os dois não receiam em levar para seus públicos – em grande maioria homens e mulheres jovens, gays ou não, negros, brancos, ativistas ou não -  a vertente de suas sexualidades.

Em tempos tão difíceis sociais e politicamente falando, onde a ala conservadora e religiosa dita (ou tenta) até o panorama da vida sexual alheia, em que ser de outra sexualidade ou gênero é atestado de anormalidade e achincalhamento público, Liniker “chega chegando” com sua vivacidade. Do alto de seus 21 anos recém completados em julho, o cantor (ou cantora, tanto faz para ele) não manda recado e define-se como “negro, pobre e gay” sem rodeios. Inspirado pela Soul e Black music, Liniker subverte a questão de gênero e faz de seu corpo, além do trabalho, um ato político. Com saias, brincos, colares, batons, turbantes e outros elementos ele imprime um visual andrógino ou transgênero muito eloqüente, mas que não perpassa as ondas sonoras que sua voz grave emite. Acompanhado de seus Caramelows (nome de sua banda), o artista vem despontando no cenário musical brasileiro com seu EP “Zero”, celebrado pela crítica especializada e um público que, apesar de seleto, cresce a cada dia por enxergar nele a voz que vem das periferias, apoiado sob as vestes de um colorido arco íris LGBT que se traduz em uma poderosa mensagem de otimismo, crença e ativismo contra as opressões das minorias, tal qual sua “oração da lacração”. “Remonta”, seu primeiro álbum, está em fase de lançamento após financiamento coletivo.



Já Johnny Hooker é a efusão em pessoa. Com um sotaque carregado o ator, compositor  e cantor combina elementos teatrais, poéticos e musicais em cada apresentação. Alijado sobre a força dos orixás, Hooker despeja emoções à flor da pele vivenciadas e traduzidas com muita força e eloqüência em “Eu vou fazer uma macumba pra te amarrar, maldito!”, título de seu encarte. Catártico, as vicissitudes daquilo que é amar são conduzidas com muito amor, mágoa, ternura, alegria e também raiva em seu álbum, que bateu 5 milhões de downloads no serviço de streaming Spotify. “Amor Marginal”, “Segunda Chance”, “Desbunde Geral”e a faixa título conferem a dimensão exata desse talento premiado por júri popular e público na edição 2015 da revista “Rolling Stones”. Com uma voz aguda e performático como Ney Matogrosso, Hooker cativa uma legião de jovens por todo o Brasil, que copiam seu estilo ousado de se vestir e maquiar mas, principalmente, se encantam pela sensibilidade de quem canta com a alma e contra qualquer tipo de preconceito.



Para quem temia o “fim” da MPB, com o progresso de outros estilos musicais e o distanciamento do público jovem pelo segmento, Liniker e Johnny Hooker chegam na hora certa para renovar o movimento e brilhar sob os holofotes do sucesso.




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